sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Quem é Auta de Souza?

Auta de Sousa nasceu em Macaíba, então Arraial, depois cidade do Rio Grande do Norte a 12 de Setembro de 1876. Era magrinha, calada, de pele clara, um moreno doce à vista como veludo ao tacto. Antes de ter completado 3 anos, ficou órfã de mãe e aos 4 anos de pai. Sua existência na Terra foi assinalada por sofrimentos acerbos. Ainda menina, assistiu à morte de um de seus irmãos, vitimado pelo fogo produzido pela explosão de um lampião a querosene.

Antes dos 12 anos, foi matriculada no Colégio São Vicente de Paulo, no bairro da Estância, onde recebeu carinhosa acolhida por parte das religiosas francesas que o dirigiam e lhe ofereceram primorosa educação: Literatura, Inglês, Música, Desenho e Francês, o que lhe permitiu ler no original Lamartine, Victor Hugo, Chateaubriand e Fénelon.
De 1888 a 1890, a jovem Auta estuda, recita, verseja, ajuda as irmãs do Colégio e aprimora a beleza de sua fé, na leitura constante do Evangelho.

Aos 14 anos manifestaram-se os primeiros sintomas da enfermidade que lhe roubou, em plena juventude, o viço, e foi a causa de sua morte, ocorrida em 7 de fevereiro de 1901, com 24 anos de idade.

O forte sentimento religioso e mesmo a doença não impediram de ter uma vida absolutamente normal em sociedade.
Era católica, mas não submissa ao clero. Era comunicativa, alegre, sociável. A religiosidade dela era profunda, sincera, medular, mas não ascética, mortificante, mística. Seu amor por Jesus e pelo Anjo da Guarda não a distanciaram de todos os sonhos das donzelas: amor, lar, missão maternal.

Com 16 anos, ao revelar o seu invulgar talento poético, enamorou-se do jovem promotor público de Macaíba, João Leopoldo da Silva Loureiro. Dotada de aguda sensibilidade e imaginação ardente, dedicava ao namorado amor profundo, mas a tuberculose progredia e seus irmãos convenceram-na a renunciar. A separação foi cruel, mas apenas para Auta. A João Leopoldo faltava o refinamento espiritual para perceber o sentimento que extravasava através dos olhos meigos a grande poetisa.

Essa sucessão de golpes dolorosos marcou profundamente sua alma de mulher, caracterizada por uma pureza cristalina, uma fé ardente e um profundo sentimento de compaixão pelos humildes, cuja miséria tanto a comovia. Era vista lendo para as crianças pobres, para humildes mulheres do povo ou velhos escravos, as páginas simples e ingénuas da "História de Carlos Magno", brochura que corria os sertões, escrita ao gosto popular da época.

A orfandade da Poetisa ainda criança; a desencarnação trágica de seu irmão; a moléstia contagiosa e a frustração no amor, amalgamados à forte religiosidade de Auta, levaram-na a compor uma obra poética singular na História da Literatura Brasileira: "Horto", seu único livro, um cântico de dor, mas também de fé cristã.

O sofrimento veio burilar a sua inata sensibilidade, que transbordou em versos comovidos e ternos, ora ardentes, ora tristes, lavrados à sombra da enfermidade, no cenário desolador do sertão de sua terra.

Em 14 de Novembro de 1936, houve a instalação da Academia Norte Rio Grandense de Letras, com a poltrona XX dedicada a Auta de Souza.

Livre do corpo totalmente desgastado pela enfermidade, Auta de Souza, irradiando luz própria, lúcida e gloriosa, alçou voo em direcção à Espiritualidade Maior. Mas a compaixão que sempre sentira pelos sofredores fez com que a poetisa, em companhia de outros Espíritos caridosos, visitasse constantemente a crosta da Terra. Foi através de Chico Xavier que ela, pela primeira vez, revelou sua identidade, transmitindo suas poesias, em 1932, na primeira edição do "Parnaso de Além Túmulo".

Em sua existência física, Auta de Souza foi a ave cativa que cantou seu anseio de liberdade; o coração resignado que buscou no Cristo o consolo das bem-aventuranças prometidas aos aflitos da Terra.


Fio partido

Fugir à mágoa terrena
E ao sonho, que faz sofrer,
Deixar o mundo sem pena
Será morrer?

Fugir neste anseio infindo
À treva do anoitecer,
Buscar a aurora sorrindo
Será morrer?

E ao grito que a dor arranca
E o coração faz tremer,
Voar uma pomba branca
Será morrer?

II

Lá vai a pomba voando
Livre, através dos espaços...
Sacode as asas cantando:
"Quebrei meus laços!"

Aqui na amplidão liberta,
Quem pode deter-me os passos?
Deixei a prisão deserta,
Quebrei meus laços!

Jesus, este vôo infindo
Há de amparar-me nos braços
Enquanto eu direi sorrindo:
Quebrei meus laços!


Janeiro, 1901

Fonte: www.feparana.com.br

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